
"Alice" [2005] - Por onde andas?
É sempre bom constatar que existem bons filmes portugueses, bons actores e uma boa adesão por parte dos espectadores às produções nacionais ( como reparei no dia de estreia do filme). O ponto importante aqui é o filme ter, de facto, qualidade. É com agrado que se vê um filme português, de um realizador estreante ( Marco Martins), muito promissor, a ser premiado num dos grandes palcos do cinema mundial: Veneza. É também um sinal de incentivo a todos os produtores, realizadores, actores de que, com poucos meios, se podem fazer grandes filmes.
"Alice" é um filme triste e cru. Representa a perda de alguém que se ama muito, de forma transparente e sem subtrefúgios. O "olhar a nu" transmitido, ao longo do filme, pelos demorados grandes planos do pai Mário (Nuno Lopes) e da mãe Luísa (Beatriz Batarda) é asfixiante. O espectador "vive", também, um momento difícil, durante 102 minutos de "procura obssessiva" pela filha Alice.
A fotografia pareceu-nos muito boa, oferecendo um retrato, porventura, diferente de Lisboa... Em tons frios e anónimos, condizentes com a perspetiva que Mário tem da cidade: um lugar apenas composto por ruas, carros, ruído e pessoas...muitas pessoas "desligadas" umas das outras.
Vive-se, no decurso do filme, o sentimento de alguém que perde uma filha e não aceita o convívio com a sua ausência, procurando (através da rotina obssessiva de vigilância e repetição) encontrar, no meio da multidão, alguém, um vulto, um casaco azul, ou os cabelos castanhos de Alice.
A forma como Marco Martins estrutura o filme (de modo circular e rotineiro) obriga-nos, também, aqui e ali, a procurar Alice, entre as muitas pessoas que aleatoriamente circulam em redor de Mário; cerceando as expectativas do pai na sua busca e agudizando a dor da mãe na sua resignação.
No final, as dúvidas permanecem mas a clareza dos factos chega-nos fria e dura de aceitar: a realidade é assim fielmente retratada - não há revelações de última hora, não há reviravoltas engendradas. O que existe é a vida como ela é perante uma ausência que "lhe passa ao lado" porque, precisamente, já não existe. A "ausência" está por todo o lado, rodeia Mário em todos os seus movimentos. É um facto que escapa à esperança recriativa do homem.
Mário perde, de facto, a sua filha... mas ganha de novo a sua mulher e, com ela, mais um fôlego para viver.
"Alice" conta a história de um pai, Mário ( Nuno Lopes) e mãe ( Beatriz Batarda), que desde o desaparecimento da sua filha de 4 anos há 193 dias, procuram viver as suas vidas na esperança de reencontrar Alice. Assim sendo, todos os dias, Mário, sai de casa e repete o mesmo percurso que fez no dia em que Alice desapareceu."
A ver, sem dúvida alguma.
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